Anna Bella Geiger [Rio de Janeiro, 1933]
vive e trabalha no Rio de Janeiro


Expoente da arte brasileira e global, Anna Bella Geiger tem uma carreira que compreende sete décadas, desde 1960 até à atualidade. Sua trajetória acompanhou o desenvolvimento institucional das artes no Brasil, e também do mercado da arte brasileiro e sua internacionalização. Geiger, filha de imigrantes judeus poloneses, estudou com a artista polaco-brasileira Fayga Ostrower no início de sua trajetória artística. Em 1953, participou da 1ª Exposição nacional de arte abstrata ao lado de Ivan Serpa, Antonio Bandeira, Lygia Clark e Lygia Pape. Após o estudo com Ostrower, artista de vertente abstrato-geométrica, expandiu sua produção artística nas décadas subsequentes com um corpo de trabalho diverso em temas e plural em meios, abandonando tendências abstratas com o início da ditadura militar brasileira em 1965. Influenciada pela Nova Figuração, realiza entre 1965 e 1968 sua série 'visceral' — termo cunhado por Mário Pedrosa. Esse conjunto de obras abre produção para apropriação e subversão cartográfica, técnicas constantes em sua obra desde então. Na década de 1970, passa a produzir em contato com correntes conceituais, englobando também meios reprodutíveis, como a fotografia, a colagem e o vídeo. Sua obra faz parte das coleções do MoMA, Nova York; Tate Modern e Victoria & Albert Museum, Londres; MACBA, Barcelona; Museu de Arte Moderna de São Paulo [MAM-SP]; Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo [MAC-USP]; entre outras.

A arte produzida por Anna Bella Geiger tem um caráter dicotômico, contrastante e fronteiriço. Sua obra tem uma forte potência crítica, e desafia definições geopolíticas hegemônicas, constituindo uma obra diversa e consistente. Com a série visceral, seu trabalho adquire completude ao extrair formas de órgãos humanos e colocá-los em evidência e contraste contra o fundo monocromático — alusão à violência do regime ditatorial. Geiger assume naquele momento a investigação das formas em contraposição aos seus significados atribuídos. Ao subverter a leitura e o conteúdo das cartografias ela desafia noções culturais de centro e periferia. Através de suas reflexões visuais, Anna Bella desenvolveu uma poética contemporânea do espaço. Pela inviabilização da leitura objetiva dos mapas, acabou também por liberar o conhecimento crítico pelo qual se é possível adquirir uma nova leitura do mundo. Com a série Retratos [1970], a artista consolida a pujança crítica de sua obra e reflete a herança colonial brasileira, por exemplo, com a fundamental obra Brasil Nativo/Brasil Alienígena (1977), a qual congrega a reflexão entre os âmbitos da arte, história e ciências sociais.


/ A key figure in both Brazilian and global art, Anna Bella Geiger's career spans seven decades, ranging from 1960 to the present day. Her career has parallelled the institutional development of the arts in Brazil, as well as the Brazilian art market and its internationalization. Geiger, the daughter of Polish Jewish immigrants, studied with the Polish-Brazilian artist Fayga Ostrower at the beginning of her artistic career. In 1953, she took part in the 1st National Abstract Art Exhibition alongside Ivan Serpa, Antonio Bandeira, Lygia Clark, and Lygia Pape. After studying with Ostrower, a geometric abstract artist, she expanded her artistic production during the subsequent decades with a body of work that is diverse in terms of both its themes and form, abandoning her abstract tendencies during the start of the Brazilian military dictatorship in 1965. Influenced by New Figuration, between 1965 and 1968 she produced her visceral Series, a term coined by Mário Pedrosa. This body of work paves the way for appropriation and cartographic subversion, techniques that have been a constant in her work ever since. In the 1970s, she began to produce her work in dialogue with the conceptual waves of the time, also incorporating reproducible forms of media, such as photography, collage, and video. Her work is included in the collections of the Museum of Modern Art in New York [MoMA]; the Tate Modern, Victoria, and Albert Museums in London; the MACBA in Barcelona; the Museu de Arte Moderna de São Paulo [MAM-SP]; and Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo [MAC-USP]; among others.

The art produced by Anna Bella Geiger is characterized by dichotomies, contrast, and edge. Her work has a strong critical voice and challenges hegemonic geopolitical constructs, coming together to produce a diverse, rigorous oeuvre. In the Visceral Series, her composition achieves completeness by extracting shapes from human organs and placing them both in focus and contrast against a monochrome background: an allusion to the violence of the dictatorial regime. It was then that Geiger began investigating forms in opposition to their assigned meanings. By subverting the reading and content of cartographies, she challenges cultural notions of both the center and the periphery. Through her visual reflections, Anna Bella Geiger developed a contemporary poetics of space. By rendering an objective reading of maps unfeasible, it also opened the door to critical knowledge, making it possible to see the world in a new way. With the series Retratos [Portraits] [1970], Geiger wielded the critical strength of her work to reflect on Brazil's colonial heritage, for example in her quintessential work Brasil Nativo/Brasil Alienígena [Native Brazil/Alien Brazil] [1977], which brings together reflections from the academic fields of art, history, and social sciences.

Glauco Rodrigues 
[Bagé, Rio Grande do Sul, 1929 — 
Rio de Janeiro, 2004]


Original de Bagé, Rio Grande do Sul, Glauco Otávio Castilhos Rodrigues começou a pintar como autodidata em 1945. Em 1949, tem aulas com o pintor José Moraes e estuda na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro por três meses. Funda o Clube de Gravura de Bagé, em 1951, com Glênio Bianchetti e Danúbio Gonçalves. Na mesma época, faz parte do Clube de Gravura de Porto Alegre, fundado por Carlos Scliar e Vasco Prado. Muda-se para o Rio de Janeiro e passa a atuar como ilustrador na revista Senhor, em 1958. Viveu em Roma de 1962 a 1965, onde produziu trabalhos abstrato-informais e, em 1964, participa da 32ª Bienal de Veneza junto com Abraham Palatnik, Almir Mavignier, Frans Krajcberg e Tarsila do Amaral. Inspirado pelo contato com esses artistas, retorna ao Rio de Janeiro e se dedica à investigação e produção ao redor de motivos nacionais. Em sua nova morada, entrou em contato com os artistas da cidade, como Carlos Vergara e Rubens Gerchman, entre outros. Em 1966, participou da exposição Opinião 66, a qual expôs a nova Objetividade Brasileira, apresentando os expoentes da Pop Art brasileira. Rodrigues teve reconhecimento e atenção de muitos críticos locais, dentre eles Luis Fernando Verissimo, Roberto Pontual, Frederico Morais e Ferreira Gullar. Mais recentemente, também ganhou atenção internacional, atraindo o interesse do crítico suíço Simon Njami e do curador francês Nicolas Bourriaud. Após algumas décadas sem o devido reconhecimento, por conta da supervalorização de matrizes abstrato-geométricas, a redescoberta de sua produção se deu com a exposição O Universo Gráfico de Glauco Rodrigues, curada por Antônio Cava. Em 2019, uma sala dedicada à sua obra foi apresentada na Bienal de Istambul, curada por Nicolas Bourriaud.

Glauco Rodrigues construiu uma obra de fato 'brasileirista e antropófaga', compromisso declarado em seu manifesto. Ao comprimir diversos tempos e diferentes 'Brasis' em uma só obra, para o crítico suíço Simon Njami 'suas obras são uma perfeita ilustração da antropofagia e tudo o que ela engloba'. Elas contribuem para a bastardização das culturas do Brasil, por meio da união destas — ao mesmo tempo que resolvem o medo purista da miscigenação cultural. Rodrigues organizou com rigor projetual a mis-en-place de cada obra. A cena com diversos tipos brasiliensis toma forma sobre o fundo monocromático. A fotografia também foi fundamental em seu método de criação e permitiu a captação de seus motivos e a junção desses em uma mesma tela. Temas e mitos congregam e formam a imagem do Brasil contemporâneo em sua pintura através da mesclagem de elementos como 'carnaval, futebol, índio, negro, religião, política, lendas, praia. Sol, a flora e a fauna, o regional, e o nacional, o passado e o presente, a própria imagem, a de Glauco inclusive', como definiu Frederico Morais em 1986. A deglutição antropófaga que ocorre em sua pintura digere tempos, movimentos artísticos e cultura nacional e assim recepciona a complexidade brasileira por meio do ato de engolí-la por inteiro.


/ Originally from Bagé, Rio Grande do Sul, Glauco Rodrigues began painting as a self-taught artist in 1945. In 1949, he took lessons from painter José Moraes and studied at the National School of Fine Arts in Rio de Janeiro for three months. He founded the Bagé Printmaking Club in 1951 with Glênio Bianchetti and Danúbio Gonçalves. Around the same time, he joined the Porto Alegre Printmaking Club, founded by Carlos Scliar and Vasco Prado. He moved to Rio de Janeiro and began working as an illustrator for Senhor magazine in 1958. He then lived in Rome from 1962 to 1965, where he produced abstract informal works. In 1964, he took part in the 32nd Venice Biennale alongside Abraham Palatnik, Almir Mavignier, Frans Krajcberg, and Tarsila do Amaral. Inspired by his contact with these artists, he returned to Rio de Janeiro, and dedicated himself to the research and production of national motifs. In his new home, he came into contact with artists from the city, among them Carlos Vergara and Rubens Gerchman. In 1966, he participated in the exhibition Opinião 66, which presented the Nova Objetividade Brasileira [New Brazilian Objectivity], showcasing the leading figures of Brazilian pop art. Rodrigues gained recognition and attention from many local critics, among them Luis Fernando Verissimo, Roberto Pontual, Frederico Morais, and Ferreira Gullar. More recently, he also gained international recognition, attracting the interest of Swiss critic Simon Njami and French curator Nicolas Bourriaud. After the few decades that followed without his due recognition due to the overvaluation of geometric abstract movements, his work was rediscovered during the exhibition O Universo Gráfico de Glauco Rodrigues [The Graphic Universe of Glauco Rodrigues], curated by Antônio Cava. In 2019, a room was dedicated to his work at the Istanbul Biennial, curated by Nicolas Bourriaud.

Glauco Rodrigues built a body of work that was truly 'Brazilianist and anthropophagic,' a claim he made in his manifesto. By compressing different time periods and multiple 'Brazils' into a single work, Swiss critic Simon Njami stated, 'his works are a perfect illustration of anthropophagy and everything it encompasses.' They contribute to the bastardizing of Brazil's multitude of cultures, and in the act of uniting them, all the while calming purist fears of cultural miscegenation. Rodrigues rigorously organized the mise-en-place of each of his works. The scenes he creates featuring various types of Brasiliensis, take shape against a monochromatic background. Photography was also a fundamental piece of his creative practice, allowing him to capture subjects and bring them together within a single painting. Themes and myths come together to form an image of contemporary Brazil in his canvas. Frederico Morais described it as a mix of, “carnival, soccer, Indians, blacks, religion, politics, legends, beaches. Sun, flora and fauna, the regional and the national, the past and the present, the image itself — including that of Glauco,' back in 1986. The anthropophagic deglutition that takes place in his paintings digests eras, artistic movements, and national culture, thus embracing the complexity of Brazil through the act of swallowing it whole.

Jorge Guinle 
[Nova York, EUA, 1947 — 
Rio de Janeiro, 1987]


Um dos maiores contribuintes para a pintura brasileira e figura chave da Geração 80, Jorge Guinle Filho nasceu em Nova York e viveu no Rio de Janeiro até 1955. Mais tarde mora em Paris e, posteriormente, Nova York até 1965, quando muda-se para o Rio de Janeiro novamente. Até o momento em que se estabelece na antiga capital do império, Guinle já havia passado mais da metade de sua existência no exterior. Nos seus sete anos de produção artística, criou um legado expressivo e obteve reconhecimento, sendo convidado para participar de três das cinco Bienais de São Paulo da década de 1980: a 17ª edição em 1983, a 18ª em 1985 e a 20ª em 1989. Também participou de inúmeras mostras individuais e coletivas. Guinle foi um dos mais fundamentais colaboradores na exposição Como vai você Geração 80?, Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro e escreveu para o catálogo, contribuindo para o firmamento teórico do grupo.

Exímio colorista e realizador de uma pintura energética, solar e distintivamente positiva, Jorge Guinle Filho mudou permanentemente o panorama da pintura brasileira. Sua capacidade de reinterpretar as qualidades da pintura abstrata presente em outros países nas décadas de 1970 e 1980 constituiu uma obra ímpar, destacando-o entre os seus contemporâneos brasileiros. Sua pintura materializa não apenas influências matissianas e picassianas das vanguardas modernistas europeias, mas também os melhores elementos das expressões pictóricas surgidas na Europa e América do Norte nas décadas anteriores. Suas cores são díspares às do neoexpressionismo norte americano, e das propostas abstratas europeias como as do grupo alemão Die Wilde e italiano transvanguardia. Seu gesto compositivo expressa 'uma agitação feroz e bem-humorada' como notou o crítico Ronaldo Brito. Espirituosos, os títulos de suas obras exercem a função de adicionar ao dinamismo de suas pinceladas e unem o fluxo de ideias à fluidez de suas composições. Por sua vez, suas investidas cromáticas compuseram pela contiguidade e sobreposição — parte de sua técnica positiva, produzida através da adição de elementos e camadas. Guinle nunca fazia esboços para suas pinturas, sua técnica organizava-se através do gesto, através do qual apreendia as ideias e os seus redores na pintura, promovendo 'um permanente estado de apreensão', nas palavras de Christina Bach.


/ One of the most significant contributors to Brazilian painting and a key figure of the Geração 80 movement, Jorge Guinle, was born in New York and lived in Rio de Janeiro until 1955. He later resided in Paris, and then in New York until 1965, at which point he moved back to Rio de Janeiro. By the time he settled in the former imperial capital, Guinle had already spent more than half of his life abroad. During just seven years of artistic production, he built up an impressive legacy and gained critical recognition through being invited to take part in three of the five São Paulo Biennials of the 1980s: the 17th edition in 1983, the 18th, in 1985 and the 20th in 1989. He also took part in numerous solo and group exhibitions. Guinle was one of the most fundamental contributors to the exhibition Como vai você Geração 80? (How Are You, Geração 80?), at the School of Visual Arts at Parque Lage, Rio de Janeiro and wrote a portion of the exhibition catalog, contributing to the group's theoretical foundation.

A masterful colorist and the creator of an energetic, solar, and distinctly positive painting practice, Jorge Guinle Filho permanently changed the landscape of Brazilian painting. His ability to reinterpret the qualities of abstract painting present in other countries in the 1970s and 1980s set his work apart, distinguishing him among his Brazilian contemporaries. His paintings materialize not only Matissian and Picassian influences from the European modernist avant-garde, but also some of the most striking elements of the pictorial expression that emerged in the previous decades in Europe and North America. His use of colors are markedly different from those of American Neo-Expressionism and European abstract movements, such as the German group Die Wilde and Italian Transvanguardia. His compositional gestures expressed 'a fierce and humorous agitation,' as critic Ronaldo Brito noted. The witty titles of his works add to the dynamism of his brushstrokes and unite his flow of ideas with the fluidity of his compositions. In turn, his colorful strokes were composed through contrast and overlap — part of his positivistic technique, produced through the addition of elements and layers. Guinle never sketched out his work before paintings. His technique was gestural, which allowed him to grasp both ideas and his surroundings in his paintings, leading to 'a permanent state of apprehension,' in the words of Christina Bach.

Manuel Messias dos Santos 
[Aracaju, 1945 — 
Rio de Janeiro, 2001]


Manuel Messias dos Santos nasceu em Aracaju, Sergipe, e com cerca de sete anos chegou ao Rio de Janeiro com sua mãe em busca de melhores condições de vida. Sua infância foi marcada pela memória rural nordestina e a experiência urbana de conviver entre diferentes realidades sociais e econômicas. Sua mãe, personagem central e companheira de toda a vida, trabalhou como empregada doméstica na casa de personalidades da sociedade carioca ligadas ao universo das artes. Esse contato possibilitou que o jovem Messias, que já manifestava habilidade para o desenho, pudesse ter acesso a aulas de arte a partir do início dos anos 1960. O curso livre de Ivan Serpa no MAM-RJ foi o estopim para sua identificação como artista e para a sua integração no ambiente cultural da cidade. 

Por incentivo de Serpa e da artista Mirian Inez, Messias se dedicou à xilogravura. Suas obras logo passaram a fazer parte de coletivas, salões e exposições internacionais. A produção dos primeiros anos mostra a experimentação e o amadurecimento de técnicas, com a influência expressionista de artistas como Oswaldo Goeldi e da xilogravura da literatura de cordel. No final dos anos 1960, a elaboração formal de suas obras já revela a consciência dramática que será o aspecto diferencial em suas gravuras. 

Como parte de uma geração que se desenvolveu ao longo dos anos mais duros da ditadura militar, apesar de nunca ter declarado nenhum posicionamento político, Messias incorporou em suas obras a denúncia de um período marcado pelo medo e pelo terror. A série Nossa, feita ao longo da década de 1970, assume uma postura quase panfletária que nos conecta e demonstra, ao mesmo tempo, a violenta face do convívio humano. As obras de formato quadrangular escancaram incongruências da nossa sociedade e os trabalhos verticais apontam a natureza humanitária como elos para uma compreensão mais fraterna. 

Manuel Messias dos Santos é um artista de qualidade e relevância inquestionáveis. Sua vida e obra revelam as marcas das injustiças e dos problemas estruturais brasileiros. Sua trajetória pessoal escancara uma realidade escondida e esquecida às margens, invisibilizada pelo racismo estrutural, pela desigualdade histórica e geográfica e pela nossa incapacidade e desinteresse em viver em harmonia social. Esta exposição, a primeira mostra institucional dedicada à sua obra, nasce da necessidade de reconhecimento e de inclusão definitiva de sua produção na escrita das tantas e tão plurais histórias da arte brasileira.


/ Manuel Messias dos Santos was born in Aracaju, Sergipe, and arrived in Rio de Janeiro with his mother at the age of seven in search of a better life. His childhood was marked by memories of rural life in the Northeast and the urban experience of living among different social and economic realities. His mother, a central figure and lifelong companion, worked as a maid in the homes of Rio de Janeiro society figures connected to the arts. This contact enabled the young Messias, who already showed an aptitude for drawing, to have access to art classes from the early 1960s onwards. Ivan Serpa's free course at MAM-RJ was the catalyst for his identification as an artist and his integration into the city's cultural environment.

Encouraged by Serpa and artist Mirian Inez, Messias devoted himself to woodcut printing. His works soon became part of collective exhibitions, salons, and international exhibitions. His early work shows experimentation and the maturation of techniques, with the expressionist influence of artists such as Oswaldo Goeldi and the woodcut art of cordel literature. By the late 1960s, the formal elaboration of his works already revealed the dramatic awareness that would be the distinguishing feature of his prints. 

As part of a generation that developed during the harshest years of the military dictatorship, despite never having declared any political position, Messias incorporated into his works a denunciation of a period marked by fear and terror. The series Nossa, created throughout the 1970s, takes on an almost pamphleteering stance that connects us and demonstrates, at the same time, the violent face of human coexistence. The square-shaped works reveal the incongruities of our society, and the vertical works point to humanitarian nature as a link to a more fraternal understanding.

Manuel Messias dos Santos is an artist of unquestionable quality and relevance. His life and work reveal the marks of Brazilian injustices and structural problems. His personal trajectory reveals a hidden and forgotten reality on the margins, made invisible by structural racism, historical and geographical inequality, and our inability and lack of interest in living in social harmony. This exhibition, the first institutional show dedicated to his work, stems from the need for recognition and definitive inclusion of his production in the writing of the many and diverse histories of Brazilian art.


Odoteres Ricardo de Ozias
[Eugenópolis, MG, 1940 — 
Rio de Janeiro, 2011]



Odoteres Ricardo de Ozias nasceu em Eugenópolis, Minas Gerais, filho de humildes trabalhadores rurais. Passou a sua infância e juventude em meio à paisagem da zona da mata mineira, mas viveu a maior parte da sua vida em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro. A partir de 1963, trabalhou na Rede Ferroviária Federal S.A., exercendo diferentes funções, como manobrador, bilheteiro, e encarregado de portaria. Foi nesse último cargo que teve o seu primeiro e inusitado contato com a arte: para evitar o sono de horas ociosas na portaria da estação Central do Brasil, começou a desenhar e pintar com materiais que encontrava pelo escritório. Sua atividade despretensiosa chamou a atenção de uma engenheira que solicitou a sua colaboração nas ilustrações do livro Madeiras da Amazônia: identificação de 100 espécies [1981]. Alguns anos depois, outra engenheira da companhia ferroviária foi responsável por apresentar a produção de Ozias a uma comissão que o selecionou para a trigésima edição da Sala do Artista Popular, programa da Funarte e do Instituto Nacional do Folclore do Rio de Janeiro que realizou a exposição Ricardo de Ozias: pinturas em 1987. A mostra foi fundamental na trajetória de Ozias, tanto por iniciar a institucionalização de sua obra, com a incorporação de três pinturas à coleção do Museu de Folclore Edison Carneiro, quanto por contribuir significativamente para a popularização de suas pinturas, o que lhe motivou a continuar produzindo. 

No final da década de 1980 e ao longo da década seguinte, Ozias participou de dezenas de exposições individuais e coletivas no circuito da arte popular e naïf, incluindo exposições na Europa, como uma mostra coletiva na embaixada brasileira em Paris e a Trienal Internacional de Arte Naïf I’NSITA 94, na Bratislava. No Rio de Janeiro, foi um dos membros fundadores da Casa do Artista Plástico Afro-Brasileiro, associação que atuava no apoio à produção de artistas negros. Naquele momento, as pinturas de Ozias tematizavam principalmente cenas rurais, além de algumas representações urbanas e religiosas. Um homem muito devoto — foi pastor de seu próprio templo da Assembleia de Deus nas décadas de 1970 e 1980 —, Ozias veio a produzir um contingente volumoso de pinturas com um sincretismo próprio e intensamente figurativo, que mescla signos do catolicismo e protestantismo, incluindo figuras demoníacas, com elementos de religiões de matriz africana, como a umbanda. 

A segunda metade dos anos de 1990 e o começo da década seguinte foi possivelmente o período em que Ozias mais produziu. Isso foi resultado do apoio que recebeu do fundador do Museu Internacional de Arte Naïf do Rio de Janeiro [MIAN], Lucien Finkelstein, que incorporou um grande número de suas obras à coleção do museu. A partir dessa aproximação e interlocução, Ozias realizou diversas séries de trabalhos em pintura, incluindo trens, cenas de carnaval e outras festas populares, cenas religiosas, paisagens naturais com animais, esportes, e cenas da história da escravidão de africanos no Brasil. Em 2001, participou de uma mostra coletiva de artistas do MIAN no Museu Olímpico de Lausanne, na Suíça, que incorporou uma de suas pinturas ao acervo.

Ozias produziu intensamente até seus últimos anos de vida, vivendo da aposentadoria de mais de três décadas de trabalho como ferroviário e do complemento proveniente da venda de suas obras. Quando sofreu um AVC em 2010, decidiu voltar para sua terra natal, onde faleceu no ano seguinte, deixando uma esposa e os três filhos de seu primeiro casamento. 


/ Odoteres Ricardo de Ozias was born in Eugenópolis, Minas Gerais, the son of humble rural workers. He spent his childhood and youth amid the landscape of the Minas Gerais forest region, but lived most of his life in Duque de Caxias, Rio de Janeiro. From 1963 onwards, he worked at Rede Ferroviária Federal S.A., performing various roles, such as shunter, ticket clerk, and gatekeeper. It was in this last position that he had his first and unusual contact with art: to avoid falling asleep during idle hours at the gate of Central do Brasil station, he began to draw and paint with materials he found around the office. His unpretentious activity caught the attention of an engineer who asked him to collaborate on the illustrations for the book Madeiras da Amazônia: identificação de 100 espécies [1981]. A few years later, another engineer from the railway company was responsible for presenting Ozias' work to a commission that selected him for the 30th edition of Sala do Artista Popular [Popular Artist's Room], a program run by Funarte and the National Folklore Institute of Rio de Janeiro, which held the exhibition Ricardo de Ozias: pinturas [Ricardo de Ozias: paintings] in 1987. The exhibition was fundamental in Ozias' career, both for initiating the institutionalization of his work, with the incorporation of three paintings into the collection of the Edison Carneiro Folklore Museum, and for contributing significantly to the popularization of his paintings, which motivated him to continue producing.

In the late 1980s and throughout the following decade, Ozias participated in dozens of solo and group exhibitions in the popular and “naïf” art circuit, including exhibitions in Europe, such as a group show at the Brazilian embassy in Paris and the International Triennial of Naïf Art I'NSITA 94 in Bratislava. In Rio de Janeiro, he was one of the founding members of CAPA [Casa do Artista Plástico Afro-Brasileiro], an association that supported the work of black artists. At that time, Ozias' paintings mainly depicted rural scenes, as well as some urban and religious representations. A very devout man (he was pastor of his own Assembly of God temple in the 1970s and 1980s), Ozias produced a voluminous body of paintings with a unique and intensely figurative syncretism, mixing signs of Catholicism and Protestantism, including demonic figures, with elements of African-based religions such as Umbanda.

The second half of the 1990s and the beginning of the following decade was possibly the period in which Ozias produced the most. This was the result of the support he received from the founder of the International Museum of Naïf Art in Rio de Janeiro [MIAN], Lucien Finkelstein, who incorporated a large number of his works into the museum's collection. From this rapprochement and dialogue, Ozias produced several series of paintings, including trains, scenes from carnival and other popular festivals, religious scenes, natural landscapes with animals, sports, and scenes from the history of African slavery in Brazil. In 2001, he participated in a collective exhibition of MIAN artists at the Olympic Museum in Lausanne, Switzerland, which incorporated one of his paintings into its collection.

Ozias produced intensely until his last years, living off his retirement from more than three decades of work as a railroad worker and the income from the sale of his works. When he suffered a stroke in 2010, he decided to return to his homeland, where he died the following year, leaving behind a wife and three children from his first marriage.
 

Paulo Pedro Leal
[Rio de Janeiro, 1894 – 
São João de Meriti, RJ, 1968]



Nasceu no Morro da Viúva, em Botafogo, de pais baianos. Outra importante figura em sua formação foi seu tio, Luís Joaquim de Araújo, com quem teria sido iniciado como pai-de-santo. O artista, que assinava PPL em suas pinturas, realizou um importante retrato político e crítico da modernidade brasileira, abordando temas como disputas de poder, hierarquia e racialidade. Dentre os eventos que marcaram a sua produção, está a Primeira Guerra Mundial. Pintou navios afundando e soldados em ação. Também fez obras com referências ao sincretismo religioso da umbanda, assim como criou brinquedos e imagens sacras utilizando madeira, papelão e barro. Fez pinturas murais nas paredes do centro de umbanda que comandava como pai-de-santo, e em outros terreiros. Expôs suas pinturas na calçada do Passeio Público e passou a viver da venda destes trabalhos, e de outras atividades, como de sua colaboração para os carros alegóricos da Escola de Samba Unidos de Coelho da Rocha.  

Em 1952, Leal conheceu o crítico, professor e adido cultural da embaixada norte-americana, Marcus Gordon Brow, que comprou algumas telas suas, e lhe presenteou com um exemplar de Modern American Painting, de Peyton Boswell. Em 1956, ocorreu a sua única individual em vida, organizada por Jean Boghici na Petite Galerie, no Rio de Janeiro. Em 1961, o marchand enviou ao X Salão Nacional a tela Dragão do Oriente, que recebeu o prêmio aquisição, figurando no acervo do Museu Nacional de Belas Artes.

Em 1967, Leal foi citado no Peintres Naïfs, dicionário mundial de pintores do gênero, editado pelo crítico Anatole Jakovsky. Desde então, participou de diversas exposições individuais e coletivas, como: Instinto e Criatividade Popular [Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro, 1975]; Tradição e Ruptura: síntese da arte e cultura brasileiras [Fundação Bienal de São Paulo, 1984]; Brasil l + 500 Mostra do Redescobrimento [Fundação Bienal de São Paulo, 2000]; Encontros e Reencontros na Arte Naïf: Brasil-Haiti [Centro Cultural Banco do Brasil, Brasília, 2005]; Entreolhares: poéticas d’alma brasileira [Museu AfroBrasil, São Paulo]; Histórias da Sexualidade [MASP, 2016]; ARTE NAÏF — Nenhum museu a menos (Escola de Artes Visuais do Parque Lage, Rio de Janeiro, 2019); Histórias brasileiras [MASP 2023]; Paulo Pedro Leal [Pinacoteca, 2025]. Recentemente, uma obra da sua autoria foi incorporada ao acervo da Pinacoteca.

 
/ Born in Morro da Viúva, Botafogo, to parents from Bahia. Another important figure in his upbringing was his uncle, Luís Joaquim de Araújo, who initiated him as a pai-de-santo [Candomblé priest]. The artist, who signed his paintings PPL, produced an important political and critical portrait of Brazilian modernity, addressing themes such as power struggles, hierarchy, and race. Among the events that marked his production was World War I. He painted sinking ships and soldiers in action. He also created works with references to the religious syncretism of Umbanda, as well as toys and sacred images using wood, cardboard, and clay. He painted murals on the walls of the Umbanda center he ran as a pai-de-santo, and in other terreiros. He exhibited his paintings on the sidewalk of the Passeio Público and began to make a living from the sale of these works and other activities, such as his collaboration on the floats for the Unidos de Coelho da Rocha Samba School.  

In 1952, Leal met the critic, professor, and cultural attaché of the US Embassy, Marcus Gordon Brow, who bought some of his paintings and gave him a copy of Peyton Boswell's Modern American Painting. In 1956, his only solo exhibition during his lifetime took place, organized by Jean Boghici at the Petite Galerie in Rio de Janeiro. In 1961, the art dealer sent the painting Dragão do Oriente [Dragon of the East] to the 10th National Salon, which received the acquisition award and is now part of the collection of the National Museum of Fine Arts.

In 1967, Leal was mentioned in Peintres Naïfs, a worldwide dictionary of painters of the genre, edited by critic Anatole Jakovsky. Since then, he has participated in several solo and group exhibitions, such as: Instinct and Popular Creativity [National Museum of Fine Arts, Rio de Janeiro, 1975]; Tradition and Rupture: synthesis of Brazilian art and culture [São Paulo Biennial Foundation, 1984]; Brazil l + 500 Rediscovery Exhibition [São Paulo Biennial Foundation, 2000]; Encounters and Reencounters in Naïf Art: Brazil-Haiti [Banco do Brasil Cultural Center, Brasília, 2005]; Entreolhares: Poetics of the Brazilian Soul [AfroBrasil Museum, São Paulo]; Histórias da Sexualidade [MASP, 2016]; NAÏF ART — Not One Museum Less [Parque Lage School of Visual Arts, Rio de Janeiro, 2019]; Brazilian Stories [MASP 2023]; Paulo Pedro Leal [Pinacoteca, 2025]. Recently, one of his works was added to the Pinacoteca collection.


Rosina Becker do Valle
[Rio de Janeiro, 1914 – 
Rio de Janeiro, 2000]



Começa a pintar em 1955, quando se inscreve no curso de Ivan Serpa na escola do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Dentre seus temas principais estão a fauna e a flora brasileiras, as festas populares, como o carnaval e os ritos das religiões praticadas no país, sobretudo o cristianismo e as religiões de matriz africana. As suas composições usam de tons vibrantes, em uma paleta diversa mas harmoniosa de cores. Sua pincelada produz uma profusão de detalhes e texturas na representação densa de multidões e florestas. 

Realizou mostras individuais em galerias e espaços institucionais, como: Galeria GEAD [Rio de Janeiro, 1963], Galeria Barcinski [Rio de Janeiro, 1965], Galeria Cosme Velho [São Paulo, 1967], Palácio da Foz [Lisboa, 1969], Galeria Casablanca [Rio de Janeiro, 1980], Maria Augusta Galeria de Arte [Rio de Janeiro, 1984], Galeria Jacques Ardies [São Paulo, 1987], Retrospectiva no Museu Internacional de Arte Naïf [Rio de Janeiro, 1997]. Participou de mostras coletivas, como: Bienal de São Paulo [1959 e 1963], Salão Nacional de Belas Artes [Rio de Janeiro, 1967, 1968 e 1969], Arthur Tooth Gallery [Londres, 1971], Os dez mais importantes pintores primitivos na América Latina, Galeria Bonino [Rio de Janeiro, 1975], Peintres Brésiliens à Paris, Hotel George V, [Paris, 1981], O Mundo Fascinante dos Pintores Naïfs, Paço Imperial [Rio de Janeiro, 1998]. 2ª Bienal Brasileira de Arte Naif, Sesc [Piracicaba, 1994], Encontros e Reencontros na Arte Naïf: Brasil-Haiti, Centro Cultural Banco do Brasil [Brasília, 2005] e Museu da Arte Brasileira, MAB-FAAP [São Paulo, 2005]. Tem obras no Musée d'Art Naïf de L'Île de France, no Museu de Arte Moderna de Hamburgo e de Buenos Aires, além de ter obras reproduzidas em livros editados no Brasil, Suíça, Inglaterra e França.


/ Rosina began painting in 1955, when she enrolled in Ivan Serpa's course at the Rio de Janeiro Museum of Modern Art school. Among her main themes are Brazilian fauna and flora, popular festivals such as Carnival, and the rites of religions practiced in the country, especially Christianity and African-based religions. Her compositions use vibrant tones in a diverse but harmonious palette of colors, and her brushstrokes produce a profusion of details and textures in his dense representations of crowds and forests.

Rosina has held solo exhibitions in galleries and institutional spaces, such as: Galeria GEAD [Rio de Janeiro, 1963], Galeria Barcinski [Rio de Janeiro, 1965], Galeria Cosme Velho [São Paulo, 1967], Palácio da Foz [Lisbon, 1969], Casablanca Gallery [Rio de Janeiro, 1980], Maria Augusta Art Gallery [Rio de Janeiro, 1984], Jacques Ardies Gallery [São Paulo, 1987], Retrospective at the International Museum of Naïf Art [Rio de Janeiro, 1997]. She participated in group exhibitions such as: São Paulo Biennial [1959 and 1963], National Fine Arts Salon [Rio de Janeiro, 1967, 1968, and 1969], Arthur Tooth Gallery [London, 1971], The Ten Most Important Primitive Painters in Latin America, Bonino Gallery [Rio de Janeiro, 1975], Peintres Brésiliens à Paris, Hotel George V, [Paris, 1981], The Fascinating World of Naïve Painters, Paço Imperial [Rio de Janeiro, 1998]. 2nd Brazilian Biennial of Naïve Art, Sesc [Piracicaba, 1994], Encounters and Reencounters in Naïve Art: Brazil-Haiti, Banco do Brasil Cultural Center [Brasília, 2005], and Museum of Brazilian Art, MAB-FAAP [São Paulo, 2005]. She has works in the Musée d'Art Naïf de L'Île de France, the Museum of Modern Art in Hamburg and Buenos Aires, as well as works reproduced in books published in Brazil, Switzerland, England, and France.



© 2025 / Danielian/ RJ
Rua Major Rubens Vaz, 414
Gávea, Rio de Janeiro / RJ

Seg–Sex [Mon–Fri] 11h–19h
Sáb [Sat] 11h–15h

+ 55 21 2522-4796
contato@danielian.com.br
/ SP
Rua Estados Unidos, 2114
Jardim Paulista, São Paulo / SP

Seg–Sex [Mon–Fri] 11h–19h
Sáb [Sat] 11h–15h

+55 11 99928-0501
sp@danielian.com.br